quarta-feira, 27 de novembro de 2013

NÃO, VOCÊ NÃO É A IGREJA!

NÃO, VOCÊ NÃO É A IGREJA!

vcnaoeigreja_480x252pxPor Frank Brito
“E, perseverando unânimes todos os dias no templo, e partindo o pão em casa, comiam juntos com alegria e singeleza de coração, Louvando a Deus, e caindo na graça de todo o povo. E todos os dias acrescentava o Senhor à Igreja aqueles que se haviam de salvar”. (Atos 2.46-47)
“Contudo, uma vez que agora nosso propósito é discorrer acerca da Igreja visível, aprendamos, mesmo do mero título mãe, quão útil, ainda mais, quão necessário nos é seu conhecimento, quando não outro nos é o ingresso à vida, a não ser que ela nos conceba no ventre, a não ser que nos dê à luz, a não ser que nos nutra em seus seios, enfim, sob sua guarda e governo nos retenha, até que, despojados da carne mortal, haveremos de ser semelhantes aos anjos (Mt 22.30). Porque nossa habilidade não permite que sejamos despedidos da escola até que tenhamos passado toda nossa vida como discípulos. Anotemos também que fora de seu grêmio não há de esperar-se nenhuma remissão de pecados, nem qualquer salvação”. (João Calvino, Institutas da Religião Cristã, 4:1:5)
Um movimento que cresce cada vez mais em nosso país é o dos “cristãos desigrejados”. São pessoas que professam o Cristianismo, mas que, por diversos motivos, abandonaram a Igreja. Muitos são os argumentos utilizados para justificar o abandono. O objetivo deste artigo é analisar uma destas justificativas: a ideia de que a Igreja de Jesus Cristo não é visível e institucional, mas que cada cristão faz parte da Igreja, ainda que ele se recuse a frequentar qualquer culto ou se submeter a qualquer autoridade eclesiástica.
Um erro frequente entre cristãos modernos é o menosprezo e ignorância em relação ao que a Bíblia ensina sobre a Igreja visível e institucional. É uma heresia que se manifesta de muitas maneiras, mas, basicamente, se resume a ideia de que não temos a obrigação de frequentar e ser membro de uma igreja, pois, supostamente, cada cristão já “é igreja” onde quer que estejam e qualquer aglomeração de cristãos também “é igreja” e, consequentemente, basta se encontrar ocasionalmente com outros “desigrejados” para bater um papo sobre Deus que as obrigações bíblicas relacionadas à “comunhão dos santos” já terão sido cumpridas.
Na segunda vez em que a palavra “igreja” aparece no Novo Testamento, já podemos constatar o absurdo de dizer que cada cristão individualmente “é igreja” ou que qualquer aglomeração de cristãos seja uma igreja:
“Ora, se teu irmão pecar contra ti, vai, e repreende-o entre ti e ele só; se te ouvir, ganhaste a teu irmão; Mas, se não te ouvir, leva ainda contigo um ou dois, para que pela boca de duas ou três testemunhas toda a palavra seja confirmada. E, se não as escutar, dize-o à igreja; e, se também não escutara igreja, considera-o como um gentio e publicano. Em verdade vos digo que tudo o que ligardes na terra será ligado no céu, e tudo o que desligardes na terra será desligado no céu”. (Mateus 18.15-18)
Aqui Nosso Senhor explicou como deve ser o procedimento por parte daqueles que foram seriamente ofendidos por alguém que, presume-se, é cristão. Inicialmente, o ofendido não deve expor o ofensor. Deve procurar resolver o problema a sós com o ofensor. O segundo passo, caso o ofensor não se arrependa do que fez, é chamar duas ou três testemunhas para buscar resolver o problema. Novamente, o ofensor não foi exposto publicamente. A diferença é que agora há a presença de duas ou três outras pessoas. É somente depois destes dois passos que o problema é finalmente levado a Igreja.
É aqui que devemos notar algo crucial. Todo o processo descrito por Jesus incluiria somente cristãos. A parte ofendida e as duas ou três testemunhas são cristãs e, segundo Jesus, deve-se presumir que o ofensor também seja até que todas as tentativas de conduzi-lo ao arrependimento tenham se esgotado. Mas, ainda assim, é somente no terceiro passo que Jesus falou na igreja. Ainda que Jesus tenha falado de cristãos o tempo inteiro, ele não reconheceu cada um desses cristãos como sendo igreja. A parte ofendida era um cristão. Mas, ele não era a igreja. As duas ou três testemunhas também eram cristãs. Todavia, eles também não eram a igreja. Jesus diz que eles deveriam falar a igreja. Isso demonstra que é a falsa a ideia de que cada cristão individualmente seja igreja ou que qualquer aglomeração de cristãos seja igreja. Se cada cristão individualmente fosse a igreja, então o problema já estaria sendo tratado pela igreja desde o momento em que o indivíduo que foi conversar com seu ofensor. Se qualquer aglomeração de cristãos fosse uma igreja, então o problema já estaria sendo tratado pela igreja desde o momento em que as duas ou três testemunhas foram acompanhar o indivíduo que foi ofendido. O indivíduo ofendido junto de duas ou três testemunhas somam três ou quatro cristãos. Eles eram uma igreja? Não. Pois, caso o ofensor não os escutasse, só então é que o problema seria levado à igreja. Isso mostra que a Igreja não é simplesmente as pessoas. A Igreja inclui as pessoas, mas não é simplesmente isso. A Igreja é maior do que as pessoas. A Igreja é uma instituição.
Para perceber como a visão dos desigrejados sobre a “igreja” é falsa, basta se fazer a seguinte pergunta: “Como um desigrejado poderia obedecer a Mateus 18? Como seria possível cumprir o terceiro passo da ordem de Jesus?”
O Governo Eclesiástico
A Igreja de Cristo não é uma anarquia. Ela tem um governo. Acima de tudo, há o governo de Cristo, pois Deus “sobre todas as coisas o constituiu como cabeça da Igreja” (Ef 1.22). E, abaixo de Cristo, Deus instituiu também um governo humano para Sua Igreja:
“E, tendo anunciado o evangelho naquela cidade e feito muitos discípulos, [Paulo e Barnabé] voltaram para Listra, Icônio e Antioquia, confirmando as almas dos discípulos, exortando-os a perseverarem na fé, dizendo que por muitas tribulações nos é necessário entrar no reino de Deus. E, havendo-lhes feito eleger presbíteros em cada igreja e orado com jejuns, os encomendaram ao Senhor em quem haviam crido”. (Atos 14.21-23)
Aqui nós aprendemos que os apóstolos, neste caso Paulo e Barnabé (At 14.14), depois de estabelecerem novas igrejas em novos lugares, promoviam uma eleição em cada igreja para que homens fossem ordenados a presbíteros. Antes da eleição, eles eram membros comuns das igrejas. Depois da eleição, recebiam a autoridade para governar a Igreja. A palavra presbítero é πρεσβύτερος (presbuteros) no grego bíblico. A palavra também pode ser traduzida como ancião. Em outros textos, aprendemos também que o ofício do presbítero (πρεσβύτερος – presbuteros) era equivalente ao ofício do bispo (ἐπίσκοπος – episkopos) e ao de pastor (ποιμήν – poimēn). As três palavras eram usadas como sinônimas:
“E de Mileto mandou a Éfeso, a chamar os presbíteros (πρεσβύτερος – presbuteros) da igreja… Olhai, pois, por vós, e por todo o rebanho (ποίμνιον – poimnion) sobre que o Espírito Santo vos constituiu bispos (ἐπίσκοπος – episkopos), para apascentardes (ποιμαίνω – poimainōa) a igreja de Deus, que ele resgatou com seu próprio sangue. Porque eu sei isto que, depois da minha partida, entrarão no meio de vós lobos cruéis, que não pouparão ao rebanho; E que de entre vós mesmos se levantarão homens que falarão coisas perversas, para atraírem os discípulos após si”. (Atos 20.17,28-30)
Aqui o Apóstolo Paulo falou às autoridades eclesiásticas de Efésios sobre como os presbíteros/bispos/pastores foram instituídos por Deus para governar Sua Igreja, o que inclui a necessidade de protegê-la de falsos mestres. Ele escreveu essencialmente o mesmo nas cartas a Tito e Timóteo:
“Por esta causa te deixei em Creta, para que pusesses em boa ordem as coisas que ainda restam, e de cidade em cidade estabelecesses presbíteros (πρεσβύτερος – presbuteros), como já te mandei: Aquele que for irrepreensível, marido de uma mulher, que tenha filhos fiéis, que não possam ser acusados de dissolução nem são desobedientes. Porque convém que o bispo (ἐπίσκοπος – episkopos) seja irrepreensível, como despenseiro da casa de Deus, não soberbo, nem iracundo, nem dado ao vinho, nem espancador, nem cobiçoso de torpe ganância; Mas dado à hospitalidade, amigo do bem, moderado, justo, santo, temperante; Retendo firme a fiel palavra, que é conforme a doutrina, para que seja poderoso, tanto para admoestar com a sã doutrina, como para convencer os contradizentes”. (Tito 1.5-9)
“Esta é uma palavra fiel: se alguém deseja o episcopado (ἐπισκοπή – episkopē), excelente obra deseja. Convém, pois, que o bispo (ἐπίσκοπος – episkopos) seja irrepreensível, marido de uma mulher, vigilante, sóbrio, honesto, hospitaleiro, apto para ensinar; Não dado ao vinho, não espancador, não cobiçoso de torpe ganância, mas moderado, não contencioso, não avarento; Que governe bem a sua própria casa, tendo seus filhos em sujeição, com toda a modéstia (Porque, se alguém não sabe governar a sua própria casa, terá cuidado da igreja de Deus?); Não neófito, para que, ensoberbecendo-se, não caia na condenação do diabo. Convém também que tenha bom testemunho dos que estão de fora, para que não caia em afronta, e no laço do diabo”. (I Timóteo 3.1-7)
Aqui nós vemos o Apóstolo Paulo estabelecendo os critérios para que alguém fosse presbítero/bispo/pastor. Primeiro, ele menciona características morais. O presbítero/bispo/pastor deve ser um cristão moralmente “irrepreensível” (Tt 1.7; I Tm 3.2). Caso o candidato seja demasiadamente dominado por fraquezas, ele não é não é apto para se tornar “despenseiro da casa de Deus” (Tt 1.7). Além disso, Paulo compara a função que o presbítero/bispo/pastor exerce na igreja com a função que o pai de família exerce em casa: “que governe bem a sua própria casa, tendo seus filhos em sujeição, com todo o respeito. pois, se alguém não sabe governar a sua própria casa, como cuidará da igreja de Deus?”. (I Tm 3.4-5) Assim como o pai tem a responsabilidade de governar sua esposa (Ef 5.24; I Co 11.3) e filhos (Ef 6.1; Cl 3.20), o presbítero/bispo/pastor tem a responsabilidade de governar a igreja de Deus.
Desigrejados que negam que a Igreja tenha um governo humano e autoridades humanas terão negar também a autoridade do pai de família, algo que foi explicitamente ordenado no quinto mandamento – “Honra a teu pai e a tua mãe” (Ex 20.12). Paulo deixou claro que a autoridade do presbítero/bispo/pastor sobre a igreja não é edificada sobre qualquer preferência ou consenso humano, mas é expressamente ordenada por Deus. Ele explicitamente comparou a autoridade do presbítero/bispo/pastor sobre a igreja com a autoridade do pai sobre sua própria família de maneira que não é possível negar uma coisa sem negar outra. Os membros da igreja não têm a mesma autoridade. “Os presbíteros… governam” (I Tm 5.7). Os outros membros da igreja não governam, mas são governados. É assim que Jesus Cristo estabeleceu Sua Igreja para ser. Como está escrito:
“Os presbíteros que governam bem sejam tidos por dignos de duplicada honra, especialmente os que labutam na pregação e no ensino”. (I Timóteo 5.17)
“Ora, rogamo-vos, irmãos, que reconheçais os que trabalham entre vós, presidem sobre vós no Senhor e vos admoestam; e que os tenhais em grande estima e amor, por causa da sua obras”. (I Tessalonicenses 5.12-13)
“Obedecei a vossos pastores, e sujeitai-vos a eles; porque velam por vossas almas, como aqueles que hão de dar conta delas; para que o façam com alegria e não gemendo, porque isso não vos seria útil”. (Hebreus 13.17)
Não Preciso de Ti!
Se Deus estabeleceu alguns na Igreja para governarem e outros para serem governados, segue-se que se alguém não governa um rebanho, ele necessariamente tem que estar submetido à autoridade daqueles que governam. Se alguém não governa, isto é, se não é presbítero/pastor/bispo, mas também, por consentimento próprio, não é governado, tal pessoa está excluída da Igreja de Deus, do corpo de Cristo e, consequentemente, deve ser, a priori, reconhecida como “gentio e publicano” (Mt 18.17). Não há alternativa lógica. A Igreja de Cristo não é uma anarquia onde “cada um [faz] o que [parece] bem aos seus olhos”. (Jz 17.6) Cristo estabeleceu Sua Igreja com um governo. Aqueles que não se submetem ao governo, não fazem parte da Igreja. Este é um dos grandes pecados dos desigrejados. Eles não se submetem as autoridades constituídas por Deus. Eles acreditam que não precisam das autoridades.
“Pois em um só Espírito fomos todos nós batizados em um só corpo, quer judeus, quer gregos, quer escravos quer livres; e a todos nós foi dado beber de um só Espírito… E o olho não pode dizer à mão: Não tenho necessidade de ti; nem ainda a cabeça aos pés: Não tenho necessidade de vós”. (I Coríntios 12.13, 21)
Aqui o Apóstolo Paulo deixou claro que aqueles que se tornam cristãos são batizados pelo Espírito no corpo. Isto é, são incluídos na Igreja. Não existe Cristianismo sem Igreja. O cristão, quando se torna cristão, é incluído na Igreja de maneira que se ele se aparta da Igreja, ele está se rebelando contra a obra do Espírito. Com base nisso, o Apóstolo explica que os cristãos, como membros da Igreja, têm dons e vocações diferentes. Mas, ainda que sejam dons e vocações diferentes, o Deus que chama é o mesmo e a Igreja é a mesma. O fato de um cristão ser chamado a exercer um dom para uma coisa não significa que ele possa desprezar aqueles que não foram chamados com a mesma vocação. “E, se todos fossem um só membro, onde estaria o corpo?” (I Co 12.19) Dentre os diversos dons que o Apóstolo cita, ele menciona os “governos” (I Co 12.28). Aqueles que foram chamados para governar são parte do corpo. “E o olho não pode dizer à mão: Não tenho necessidade de ti”. Aqueles que são governados não podem dizer aos que governam: Não preciso de ti! Deus estabeleceu alguns na Igreja para governarem e outros para serem governados. Aqueles que não se submetem aos que governam – presbíteros/bispos/pastores – pecam severamente contra Deus em sua “independência”. Deus não estabeleceu a Igreja para que cada cristão fosse independente. Ele estabeleceu a Igreja para ser governada por presbíteros/bispos/pastores. A Igreja não é cada cristão individualmente em sua própria casa onde “cada um [faz] o que [parece] bem aos seus olhos” (Jz 17.6). A Igreja é uma instituição com um governo legitimamente instituído por Deus. O Apóstolo Pedro não mediu palavras contra aqueles que se recusam a se submeter às autoridades:
“O Senhor livrar da tentação os piedosos, e reservar para o dia do juízo os injustos, que já estão sendo castigados; especialmente aqueles que, seguindo a carne, andam em imundas concupiscências, e desprezam toda autoridade. Atrevidos, arrogantes, não receiam blasfemar das dignidades”. (II Pedro 2.9-10)
A carta de Judas chega ao ponto de chamar aqueles que ensinam a rejeitar as autoridades de falsos mestres:
“Contudo, semelhantemente também estes falsos mestres, sonhando, contaminam a sua carne, rejeitam toda autoridade e blasfemam das dignidades”. (Judas 1:8)
O Culto Público
“As vossas mulheres estejam caladas nas igrejas; porque não lhes é permitido falar; mas estejam sujeitas, como também ordena a lei. E, se querem aprender alguma coisa, interroguem em casa a seus próprios maridos; porque é vergonhoso que as mulheres falem na igreja”. (I Coríntios 14.34-35)
Aqui, novamente, podemos constatar o absurdo de dizer que cada cristão individualmente é a igreja em qualquer lugar ou que qualquer aglomeração de cristãos seja uma igreja. Se cada cristão individualmente fosse igreja ou se qualquer aglomeração de cristãos fosse uma igreja, segue-se que, neste verso, Paulo estaria proibindo as mulheres de falarem em qualquer circunstancia e em qualquer lugar. Evidentemente, não é sobre isso que Paulo estava falando. A palavra igreja nestes versos, evidentemente, se refere especificamente à reunião publica especial. O que Paulo disse é que as mulheres não podem ensinar e pregar no culto público. Elas podem falar em qualquer outro lugar e situação, como, por exemplo, em suas casas, simplesmente porque neste caso elas não estão na reunião pública da igreja.
Desigrejados e outros hereges anarquistas têm dificuldades de entender isso porque eles não aceitam qualquer diferença entre o que acontece na igreja e o que acontece fora da igreja. Eles acreditam na mentira de que cada um de nós “é igreja em todo lugar” e, portanto, que não acreditam que há um momento especial para uma reunião pública especial com regras especiais que não vigoram em outros momentos. Diferente deles, o Apóstolo Paulo cria que em situações normais, as mulheres poderiam falar, mas que o culto público é uma ocasião especial com regras especiais, dentre as quais existe a seguinte regra: “as vossas mulheres estejam caladas nas igrejas; porque não lhes é permitido falar; mas estejam sujeitas”. Com isso, Paulo claramente demonstra que as igrejas devem promover cultos públicos, que os cristãos tem a obrigação de frequentá-los, que essas reuniões são distintas de situações comuns do dia a dia (já que nelas vigoram regras diferentes de situações normais) e que estas reuniões devem ser reguladas pela vontade revelada de Deus e não pelo desejo do homem (I Co 14.36). Com isso, vemos claramente que não é possível “sermos igreja” cada um em sua própria casa. Deus estabeleceu sua Igreja de forma que cada cristão tem a obrigação de frequentar reuniões públicas especiais promovidas pelas autoridades da Igreja com o propósito de cultuar ao Senhor. Na carta aos Coríntios lemos que um dos propósitos destas reuniões era o de celebrar o sacramento da Ceia do Senhor:
“Porventura o cálice de bênção, que abençoamos, não é a comunhão do sangue de Cristo? O pão que partimos não é porventura a comunhão do corpo de Cristo? Porque nós, sendo muitos, somos um só pão e um só corpo, porque todos participamos do mesmo pão… Porque eu recebi do Senhor o que também vos ensinei: que o Senhor Jesus, na noite em que foi traído, tomou o pão; E, tendo dado graças, o partiu e disse: Tomai, comei; isto é o meu corpo que é partido por vós; fazei isto em memória de mim. Semelhantemente também, depois de cear, tomou o cálice, dizendo: Este cálice é o novo testamento no meu sangue; fazei isto, todas as vezes que beberdes, em memória de mim. Porque todas as vezes que comerdes este pão e beberdes este cálice anunciais a morte do Senhor, até que venha. Portanto, qualquer que comer este pão, ou beber o cálice do Senhor indignamente, será culpado do corpo e do sangue do Senhor. Examine-se, pois, o homem a si mesmo, e assim coma deste pão e beba deste cálice. Porque o que come e bebe indignamente, come e bebe para sua própria condenação, não discernindo o corpo do Senhor. Por causa disto há entre vós muitos fracos e doentes, e muitos que dormem. Porque, se nós nos julgássemos a nós mesmos, não seríamos julgados. Mas, quando somos julgados, somos repreendidos pelo Senhor, para não sermos condenados com o mundo. Portanto, meus irmãos, quando vos ajuntais para comer, esperai uns pelos outros. Mas, se alguém tiver fome, coma em casa, para que não vos ajunteis para condenação”. (I Co 10.16-17; 11.23-34)
Aqui o Apóstolo Paulo escreveu sobre o rito da Ceia do Senhor. Ele diferenciou as refeições comuns, que comemos em casa, da Ceia do Senhor. Assim como a reunião da igreja não é uma reunião comum, mas é uma reunião especial na qual vigoram regras especiais, a Ceia do Senhor não é uma refeição comum, mas é uma refeição especial e, portanto, vigoram regras especiais. O cálice, diz ele, é o “cálice da benção”, “a comunhão do sangue de Cristo” e o pão é “a comunhão do corpo de Cristo”. Diferente de nossas refeições comuns, o propósito da Ceia do Senhor não é matar nossa fome. “Se alguém tiver fome, coma em casa” (I Co 11.34). O propósito da Ceia do Senhor é se alimentar espiritualmente.
Além disso, devemos notar que se a Ceia do Senhor é “a comunhão do corpo de Cristo”, segue-se que este rito somente pode ser celebrado sob a autoridade da Igreja. Não é uma celebração do mundo, mas daqueles que “sendo muitos, [são] um só pão e um só corpo” (I Co 10.17). Isso, por si só, explica porque desigrejados não podem celebrar a Ceia do Senhor. Eles não fazem parte do corpo porque se recusam a se submeter às autoridades do corpo e, portanto, não podem comer do pão e beber do vinho. “Porventura o cálice de bênção, que abençoamos, não é a comunhão do sangue de Cristo? O pão que partimos não é porventura a comunhão do corpo de Cristo? Porque nós, sendo muitos, somos um só pão e um só corpo, porque todos participamos do mesmo pão”. Aqueles que não fazem parte do corpo, por não se submeterem às suas autoridades, não podem se alimentar do corpo e do sangue do Senhor.
Quanto aos que participam da Ceia do Senhor, o Apóstolo Paulo ameaçou “Portanto, qualquer que comer este pão, ou beber o cálice do Senhor indignamente, será culpado do corpo e do sangue do Senhor” (I Co 11.29). Em seguida, ele explica que muitos daqueles que Deus pune com doenças e até mesmo com morte alguns dos que participam indignamente: “Por causa disto há entre vós muitos fracos e doentes, e muitos que dormem. Porque, se nós nos julgássemos a nós mesmos, não seríamos julgados” (I Co 11.30-31). Se a questão é tão séria assim para aqueles que de fato participam de algo que foi ordenado por Deus, o que se dirá então daqueles que se dizem cristãos, mas pensam ser autossuficientes e por isso não frequentam os cultos da igreja, não se submete as autoridades e não tomam a Ceia do Senhor? Como Deus vê a arrogância daqueles que pensam que podem ser independentes das ordenanças que Deus estabeleceu para Sua Igreja?
O Mito da Igreja Primitiva
Muitos desigrejados se defendem argumentando que o problema é que a igreja hoje, diferente da igreja primitiva, é muito corrompida; que eles não teriam problema em fazer parte das igrejas do Novo Testamento, mas que os tempos agora são outros. É o mito da Igreja Primitiva. O fato é que o Novo Testamento não esconde a quantidade de problemas que assolava a Igreja Primitiva. Na Igreja Primitiva havia quem matinha relações sexuais com a própria madrasta (I Co 5), quem promovia bebedeiras na Ceia do Senhor (I Co 11.23), cultos desorganizados (I Co 14) incluindo mulheres que queriam pregar e exercer autoridade na Igreja (I Co 14.34-35), quem não cria na ressurreição dos mortos (I Co 15), quem defendia a idolatria e a participação em cultos pagãos (I Co 10, Ap 2.14, 2.20-21), quem queria reinstituir a necessidade das cerimonias judaicas (Cl 2), quem defendia que a circuncisão era um critério para a salvação (At 15, Gálatas), quem defendia a justificação com base nos méritos de cumprir a Lei (Gálatas), quem defendia o racismo (Gl 2.11-12) quem pregava com segundas intenções e interesses desonestos (Fp 1.15, II Ti 6.5), quem prestava culto a anjos (Cl 2.18), quem queria favorecer os ricos e desprezar os pobres na igreja (Tg 2.1-5), quem se apresentava como cristão mas na verdade era um anticristo (I João 2.18-19) e muitas outras coisas.
O fato é que, mesmo em meio a todos esses problemas, os apóstolos nunca justificaram os desigrejados. O Novo Testamento nem sequer cogita a possibilidade de um cristão genuíno ser um desigrejado. Nas páginas do Novo Testamento, ser cristão inclui ser membro da Igreja e não ser membro da Igreja significa ser pagão. O Novo Testamento desconhece a noção de Cristianismo sem Igreja e invariavelmente trata aqueles que não fazem parte da Igreja ou que abandonam a Igreja como rebeldes contra o Senhor. E isso em nenhum momento se baseia em um conceito utópico de Igreja. A Igreja era o corpo de Cristo. Mas, ao mesmo tempo, havia igrejas em diversos níveis espirituais diferentes. Havia igrejas maravilhosas, mas havia também igrejas afundadas no pecado. A Igreja era a congregação dos santos, mas era também um lugar em que havia facções, brigas e falsos mestres. O mesmo é verdade hoje. Há igrejas maravilhosas e há igrejas extremamente problemáticas. A reação dos apóstolos diante das problemáticas nunca foi a de abandonar tudo o que foi a de anular a verdade que a Igreja visível e institucional foi estabelecida por Jesus Cristo. A reação dos apóstolos era a de lutar pela purificação e santificação da Igreja, por meio da oração, do jejum e do ensino da Palavra. É exatamente isso o que os desigrejados não querem. Preferem acreditar que isso não fazia parte do Cristianismo Primitivo e, portanto, que estão muito acima de tudo isso. Isso é quando sequer dão justificativas. Na maioria dos casos nem se importam em se justificar.
Resumo
I – A Igreja visível e institucional foi estabelecida por Deus.
II – Ela é governada por autoridades humanas.
III – Ela promove reuniões públicas para cultuar a Deus, pregar Sua Palavra e celebrar os sacramentos.
IV – Todo cristão tem a obrigação de fazer parte da Igreja, se submetendo às suas autoridades e participando das reuniões publicas.
V – O Novo Testamento não reconhece a validade de um Cristianismo fora da Igreja visível e institucional.
A Confissão Belga, um dos mais importantes documentos do protestantismo, resumiu bem a questão no Artigo 28, “O Dever de Juntar-se à Igreja”:
“Cremos, então, que ninguém, qualquer que seja a posição ou qualidade, deve viver afastado dela e contentar-se com sua própria pessoa. Mas cada um deve se juntar e se reunir a ela, mantendo a unidade da Igreja, submetendo-se a sua instrução e disciplina, curvando-se diante do jugo de Jesus Cristo e servindo para a edificação dos irmãos, conforme os dons que Deus concedeu a todos, como membros do mesmo corpo… todos os que se separam desta Igreja ou não se juntam a ela, contrariam a ordem de Deus”.
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Fonte: Bereianos. Divulgação: Púlpito Cristão.
Que o SENHOR tenha misericórdia de nós! AMÉM!

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

FÉ E CIÊNCIA!

FÉ E CIÊNCIA


Luis A R Branco

Durante algum tempo da minha vida cristã fui ensinado que questionamento é o oposto da fé e que enveredar por estes caminhos trariam grande dano a minha fé e relação com Deus. Atrelado a isto acompanhava o ensino de me afastar de certos escritores tais como Friedrich Wilhelm Nietzsche, René Descartes, Bertrand Russell, entre outros, por serem nocivos à fé cristã. No entanto, a curiosidade e minhas faculdades naturais me levaram justamente a ler tais escritos proibidos.

No entanto, como amantes dos livros, em simultâneo lia os clássicos da literatura cristã com suas teologia sólida e inabalável. Me deliciei em Martin Llloyd-Jones, João Calvino, Charles H. Spurgeon, Agostinho, Eli Stanley Jones, entre outros. Se por um lado havia questionamentos profundos, sinceros e honestos, por outro lado recebi respostas satisfatórias, profundas e honestas. Hoje, com meus quase quarenta anos, não vejo brechas em minha fé, ao contrário a vejo fortalecida.

Eu poderia até fazer uma declaração de fé para que não reste dúvida daquilo que creio, mas acho desnecessário, quem quiser ter certeza das minhas convicções basta passear pelos meus muitos artigos teológicos e concluirá por si mesmo. Concluirá também que não me identifico com a teologia da prosperidade e boa parte daquilo que é chamado de teologia neo-pentecostal. Estes sim, são os grandes nocivos à fé cristã.

O Apóstolo Pedro ao escrever sua carta deixou a seguinte orientação ao crentes dispersos por várias partes do mundo antigo, onde eram expostos às mais diversas filosofias: “Antes, reverenciai a Cristo como SENHOR em vosso coração, estando sempre preparados para responder a qualquer pessoa que vos questionar quanto à esperança que há em vós.” (1 Pe 3:15 BKJ - grifo meu). O cristão de hoje está despreparado para responder às perguntas que o mundo tem para fazer. Somos insistententes em responder perguntas que ninguém fez, a dar respostas a quem não nos pediu nenhuma, a insistir com assuntos que pouco interessa a sociedade e despreparados para aquilo que é o mais relevante na exortação de Pedro, que é mostrar ao mundo qual o real motivo da nossa esperança.

Se desejamos fazer isto teremos que reassumir algumas dianteiras há muito tempo abandonadas pela igreja, nos campos das ciências em geral. Os reformadores foram grandes entusiastas das descobertas científicas e sob os auspícios de Lutero e Calvino os cientistas antes oprimidos pela igreja romana, gozaram de liberdade no exercício de suas funções. Segundo o documento “A CIÊNCIA E A REFORMA PROTESTANTE” de Robert Hooykaas (Universidade de Utrecht) e resumido por Guilherme V. R. Carvalho do Centro Kuyper BH/Fate BH:

“Os cientistas não eram obrigados a aceitar o juízo de não cientistas em assuntos científicos, nos países protestantes. Assim aristotélicos, cartesianistas e defensores da separação entre filosofia e teologia, geocentristas e copernicanos se degladiavam sem qualquer intervenção de sínodos ou consistórios eclesiásticos. A reforma científica, como a reforma religiosa, rejeitou a crença humanista na infabilidade dos antigos.Propunha-se o retorno às fontes: ao livro das Escrituras e ao livro da natureza, e afirmava-se a liberdade de pensamento contra o controle dogmático. Assim Kepler, devoto luterano, proclamava: “Santo é lactâncio, que negava que a terra fosse esférica; santo é Agostinho, que admitia a esfericidade da Terra, mas rejeitava a existência das antípodas; santo é o Ofício, que aceitou os antípodas, embora rejeite o movimento da Terra ... porém mais santa ainda para mim é a Verdade, que revela que a Terra é uma pequena esfera, que os antípodas existem, e que a Terra está em movimento” (HOOYKAAS, 1988, p. 146).[1]


É importantíssimo restaurar esta tradição reformada do envolvimento da igreja com a ciência para que possamos continuar a ser relevantes num mundo de constantes mutações. Calvino reprovava os que negligenciavam o estudo da natureza e outras ciências, fazendo com que o protestantismo assumisse a vanguarda da academia no período pós-reforma. É possivel dizer que a reforma protestante garantiu inclusive a liberdade de pensamentos que vieram desafiar a autoridade, inerrância e inspiração das Escrituras Sagradas, como o racionalismo e hoje, a nova crítica hermenêutica. No entanto, apesar dos seus desafios à fé, não devemos temer a nenhuma corrente que porventura decida desafiar às Escrituras Sagradas, o que a igreja precisa fazer é estar apta para responder aos desafios que surgem no nosso tempo. Numa perspectiva muito particular, não acredito que a homosexualidade deva ser a ênfase apologética da igreja brasileira. Devemos sim, através das vias legais, procurar formas de salvaguardar nossos direitos, mas hoje, o que vemos dos dois lados, tanto gayistas como homofóbicos, procuram distrair a atenção da igreja e da sociedade daquilo que verdadeiramente importa, que é mostrar ao mundo qual o real motivo da nossa esperança.

Infelizmente o que observamos por parte de determinados grupos é a manipulação da Escritura e até mesmo um pseudo conhecimento cientifico para a enfatizar alguns pontos, explorando-os para conseguirem cada vez mais protagonismo. João Calvino escreveu: “É uma audácia próxima ao sacrilégio usar as Escrituras como nos apraz e brincar com elas como se fossem uma bola de ténis, como muitos já fizeram anteriormente... a primeira tarefa de um interprete é deixar que o autor diga aquilo que expressa de fato, em vez de atribuirmos a ele aquilo que achamos que ele quer dizer.”[2].

E no que diz respeito a confiabilidade das Escrituras Sagradas, nenhum outro grupo religioso possui as prerrogativas que os cristãos possuem, tendo em vista que nenhum outro texto antigo possui tanto elementos científicos e tenha vencido todos os testes de confiabiliade sofridos pela Bíblia. Se somarmos todos os manuscritos antigos testados em sua confiabilidade, apenas o Novo Testamento contou com vinte e quatro mil, duzentos e oitenta e seis manuscritos, seguido pelo Ilíadas de Homero com seiscentos e quarenta e três manuscritos. Ao examinar o Novo Testamento os cientistas concluiriam que há 99% de precisão entre os textos copiados nos referidos manuscritos, e ainda que estes apresentam um grau de 98,33% pureza em seu conteúdo, e que 99,9% do Novo Testamento foi reconstruído. Estes números são elevadíssimos num processo científico. Motivo pelo qual boa parte das academias, influenciadas pela nova critica, marxismo ou humanismo, não permitem que a Bíblia Sagrada seja estudada cientificamente em pé de igualdade com as demais teorias, pois seria o caos destas diante da Bíblia.

Concluímos este breve artigo com uma chamada para que possamos incentivar nossos jovens universitários e também seminaristas, para que sejam excelentes profissionais e teólogos, capazes de responderem com convicção aos questionamentos da sociedade atual, sem medo da ciência ou do evangelho. Como disse certo teólogo uma vez: “Se o evangelho for uma fraude, quero descobrir o quanto antes para não perder meu tempo, mas a verdade é que quanto mais estudo e ponho a prova as suas verdades sou convencido da sua inteira confiabilidade.”


Luis A R Branco é colunista do Genizah

[1] Guilherme de Carvalho, “,” Guilherme de Carvalho, November 18, 2013, accessed November 18, 2013, http://www.freewebs.com/guilhermecarvalho/a_reforma_e_a_ciencia.htm.
[2] Costa, H. (2006). Calvino de A a Z. São Paulo: Editora Vida.


Fonte:
http://www.genizahvirtual.com/2013/11/fe-e-ciencia.html

Que o SENHOR tenha misericórdia de nós! AMÉM!

terça-feira, 19 de novembro de 2013

TODOS SERÃO SALVOS NO FINAL?

TODOS SERÃO SALVOS NO FINAL?

Por Augustus Nicodemus Lopes
Os que acreditam que Deus, no final, vai perdoar, receber e dar a vida eterna a todos os seres humanos são geralmente chamados de universalista ou restauracionistas. Esta última expressão vem de apokatastasis, termo grego tirado de Atos 3:21. Ali, o apóstolo Pedro fala da “restauração de todas as coisas”. Apesar de Pedro estar se referindo à restauração da criação, os universalistas entendem que a salvação de toda a raça humana está incluída no processo.
O universalismo, portanto, é a crença de que, ao final da história deste mundo, Deus haverá de salvar todos os seres humanos, reconciliando-os consigo mesmo mediante Jesus Cristo. Nesta crença, não há lugar para a doutrina da punição eterna, a saber, a ideia de um inferno onde os pecadores condenados haverão de sofrer eternamente por seus pecados.
Muitos podem pensar que o universalismo é coisa recente de pastores modernos, como o famoso Rob Bell, por exemplo. Todavia, a salvação universal de todos é uma ideia muito antiga. O conceito já era encontrado entre os primeiros mestres gnósticos, e constituiu uma heresia que ameaçou o Cristianismo no primeiro século. Cerca de cem anos depois de Cristo, pais da Igreja como Clemente de Alexandria e seu famoso discípulo Orígenes defendiam explicitamente o universalismo. Orígenes acreditava, inclusive, que o próprio diabo seria salvo no final. Já na Reforma do século 16, Lutero, Calvino e os demais protagonistas das mudanças na Igreja igualmente rejeitaram a ideia da salvação universal de todos ao final.
O principal argumento usado em defesa do universalismo é que a Bíblia descreve Deus como sendo essencialmente amor: A consequência lógica é que o amor de Deus haverá de vencer ao final, salvando todos os homens da condenação merecida por seus pecados.
Mas, será que a Bíblia diz que o Senhor é somente amor? Encontramos no Novo Testamento quatro afirmações sobre o que Deus é, e três delas são feitas por João: Deus é “espírito” (João 4.24); “luz” (1João 1.5); e “amor” (1João 4.8,16). A quarta é contundente: “Deus é fogo consumidor” (Hebreus 12.29, reiterando o texto de Deuteronômio 4.24). É claro que essas afirmações não são definições completas de Deus – não têm como defini-lo no sentido estrito do termo –, mas revelam o que ele é em sua natureza. “Deus é amor” significa que ele não somente é a fonte de todo amor, mas é amor em sua própria essência. É importante, entretanto, reconhecer que, se Deus é amor, ele também é espírito, luz e fogo consumidor.
É preciso manter em harmonia esses aspectos do ser de Deus, pois só assim é possível compreendê-lo como um Senhor que é amor e castiga os ímpios com ira eterna. “Fogo” e “luz” são metáforas, é verdade; porém, metáforas apontam para realidades. No caso, elas querem simplesmente dizer: “Deus é santo e verdadeiro; ele se ira contra o pecado e não vai tolerar a mentira. E punirá os pecadores impenitentes.”
O maior problema que os universalistas enfrentam é lidar com as passagens da Bíblia onde, claramente, se estabelece uma divisão na humanidade entre salvos e perdidos e aquelas outras onde, abertamente, se anuncia o inferno como o destino final dos pecadores não arrependidos. A divisão da humanidade em salvos e perdidos é central nas Escrituras do Antigo Testamento (Deuteronômio 30.15-20; Jeremias 21.8; Salmo 1; Daniel 12.2 e muitas outras). Foi o próprio Jesus quem anunciou esta divisão de maneira clara no seu sermão escatológico, ao profetizar o juízo final onde a humanidade será repartida entre ovelhas e cabritos – sendo os segundos destinados ao fogo eterno, preparado para o diabo e seus anjos, ao contrário daqueles destinados à felicidade eterna (Mateus 25.31-46).
Foi o próprio Jesus quem anunciou a realidade do inferno, mais do que qualquer outro personagem do Novo Testamento: “Se o teu olho direito te faz tropeçar, arranca-o e lança-o de ti; pois te convém que se perca um dos teus membros, e não seja todo o teu corpo lançado no inferno”(Mateus 5.29); “Não temais os que matam o corpo e não podem matar a alma; temei, antes, aquele que pode fazer perecer no inferno tanto a alma como o corpo (10.28). Mais adiante, no capítulo 23 do evangelho de Mateus, a advertência de Cristo é clara: “Serpentes, raça de víboras! Como escapareis da condenação do inferno?”
No evangelho de Marcos, uma série de admoestações alerta sobre a realidade do inferno. Ao longo de três versículos do capítulo 9, o Mestre diz que é melhor ao fiel perder uma mão, um pé ou um dos olhos a ser “lançado no inferno”, caso aqueles membros o levem ao pecado. Já Lucas registra um diálogo travado entre Abraão, o patriarca, e um homem rico e impiedoso que foi lançado no fogo eterno, descrito como um lugar de “choro e ranger de dentes”. E, finalmente, uma passagem do evangelho de João explica bem a diferença entre morrer crendo ou rejeitando a salvação: “Se alguém não permanecer em mim, será lançado fora, à semelhança do ramo, e secará; e o apanham, lançam no fogo e o queimam”(João 15.6).
O universalismo é um erro teológico grave. Na verdade, mais que isso, é uma perigosa heresia. Além de não pertencer ao mundo teológico dos autores do Antigo Testamento e do Novo Testamento, a ideia da salvação universal traz diversos riscos.
Em primeiro lugar, por enfraquecer e, finalmente, extinguir todo espírito missionário e evangelístico. Se todos serão salvos ao final – inclusive os ímpios renitentes, pecadores não convertidos, incrédulos e agnósticos –, por que pregar-lhes o Evangelho? Os universalistas transformam a chamada ao arrependimento da Igreja num simples anúncio auspicioso de que todos já estão salvos em Cristo, e traveste sua missão em apenas ação social.
Segundo, porque essa doutrina falsa, levada às últimas conseqüências, acarreta necessariamente no ecumenismo com todas as demais religiões mundiais. Se todos serão salvos, as religiões que professam não podem mais ser consideradas certas ou erradas, e se tornam uma questão indiferente. Logo, o correto seria buscar uma união de todos, pois ao final teremos todos o mesmo destino.
Por último, o universalismo é um forte incentivo a uma vida imoral. Por mais que sejamos refratários à ideia das pessoas fazerem o que é certo por terem medo do castigo de Deus, ainda assim, temer “aquele que pode fazer perecer no inferno tanto a alma quanto o corpo” (na descrição de Mateus 10.28) ainda é um dos mais poderosos incentivos de Jesus para que vivamos vida santa e reta. A tendência natural do pecador que está seguro de que não sofrerá as consequências de seus pecados é mergulhar ainda mais neles. Assim, o universalismo retira os freios da consciência e abre as portas para uma vida sem preocupações com Deus.
O fato de que eu defendo a verdade bíblica do sofrimento eterno dos ímpios não significa que eu tenha prazer nisto. Só deveríamos falar deste assunto com lágrimas nos olhos e uma oração pelos perdidos em nossos lábios.

***
Augustus Nicodemus é pastor, escritor, teólogo reformado e publica suas reflexoes no blog “O Tempora, O Mores!
Que o SENHOR tenha misericórdia de nós! AMÉM!

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

O Cristo da nossa fantasia!

O Cristo da nossa fantasia

Hermes C Fernandes

Uma das passagens mais misteriosas do Novo Testamento é a que narra o encontro entre Jesus e dois dos Seus discípulos no caminho de Emaús. O que chama mais a atenção neste episódio é o fato de eles não O reconhecerem de primeira mão. O que os impediu, afinal? Ainda que fossem discípulos novatos, provavelmente já haviam estado com Ele o suficiente para reconhecê-lo. Em vez disso, travaram um diálogo onde demonstraram o quão frustrados estavam pelo fim fatídico que havia tido o seu mestre três dias antes.

Jesus se aproxima como se fosse um peregrino qualquer. Propositadamente, não se apresenta. Apenas pergunta do que se lamentavam. Eles o respondem grosseiramente: “És tu só peregrino em Jerusalém, e não sabes as coisas que nela têm sucedido nestes dias” (Lc. 24:18)?

O texto diz que eles estavam como que com os olhos vendados, de sorte que não pudessem identificar o próprio mestre. Como explicar isso?

Certamente, o que os mantinha neste estado era a própria fantasia que haviam construído acerca de Jesus. Eles mesmos confessam: “...esperávamos que fosse ele o que remisse Israel; mas agora, sobre tudo isso, é já hoje o terceiro dia desde que essas coisas aconteceram” (v 21).

Antes de condená-los, devemos considerar que esta era a mesma expectativa fantasiosa dos demais discípulos. Portanto, não era a Cristo que seguiam, mas a uma projeção de suas angústias e anseios. Para eles, Jesus deveria ser o estadista que comandaria a rebelião que tiraria Israel de sob o domínio romano e restauraria a sua soberania como nação. Há quem acredite que a intenção de Judas ao entregá-lo às autoridades era que Ele se revelasse e promovesse um levante contra Roma. O tiro parecia ter saído pela culatra. Suas fantasias desvaneceram. Nada do que sonharam ocorreu.

Deus não tem compromisso com nossas agendas particulares. Ele tem Sua própria agenda. Seus caminhos não são os nossos caminhos, nem seus pensamentos coincidem com os nossos. Que Ele é fiel, ninguém duvida. Mas fiel a quê? Fiel aos Seus propósitos e não aos nossos caprichos.

Semelhante àqueles discípulos, muitos em nossos dias estão seguindo a uma projeção a quem identificam como Cristo. Confundem a proposta do evangelho com ideologias políticas, e o reino de Deus com projetos de poder. Por isso, não reconhecem Cristo onde verdadeiramente Ele Se manifesta. Outros confundem Cristo com um gênio da lâmpada, cobrando d'Ele promessas que jamais fez.

Não percam seu tempo buscando-o nos credos e confissões. Tampouco nas estruturas denominacionais rígidas e cheirando a mofo. Ele é encontrado no caminho, no chão empoeirado da existência.

Percebendo a ignorância daqueles discípulos, pacientemente começou a abrir-lhes as escrituras, apontando os trechos que afirmavam tudo o que Ele teria que passar. Ainda assim, apesar de seus corações arderem ante a exposição da Palavra, seus olhos se mantinham cerrados.

Conhecimento das Escrituras não garante que nossos olhos espirituais estejam abertos. Decorar versículos não evidencia intimidade com o Deus revelado na Palavra.

Quando já estavam chegando à sua casa, Jesus fez como quem prosseguiria viagem. Eles, porém, insistiram para que ficasse com eles aquela noite.

Quando estavam à mesa para a refeição, Jesus tomou o pão e repartiu-o com eles. Seus olhos, então, se abriram. Mas, subitamente, Ele desapareceu diante deles.

Ora, se Jesus houvesse feito algo sobrenatural diante deles enquanto caminhavam, eles certamente O teriam reconhecido. Em vez disso, Jesus preferiu expor-lhes as Escrituras. Ele só fez algo miraculoso depois de O terem reconhecido. Imagine o susto que levaram quando Ele simplesmente desapareceu ante seus olhos!

Nenhum dos milagres feitos por Jesus tinha a intenção de provar quem Ele era. O que o movia a realizá-los era a compaixão. Penso que Ele não mudou Seu jeito de ser. Não consigo imaginar Jesus fazendo sensacionalismo em cima dos milagres como vejo alguns de Seus supostos representantes fazerem hoje na TV. Pelo contrário. Ninguém era tão discreto quanto Ele, a ponto de pedir que os curados não espalhassem o que lhes sucedera.

O mundo não reconhecerá a presença de Cristo entre nós através de nossas performances circenses. Ele O reconhecerá em nós da mesma maneira como aqueles dois O reconheceram à mesa: no partir do pão.

Um pequeno gesto de amor pode fazer cair muitas vendas. Quando os cristãos se dispuserem a repartir o que têm recebido, todos saberão que Ele está entre nós, tão vivo quanto naquele dia em que ressuscitará dentre os mortos.




Hermes C Fernandes é parceiro do  Genizah


Fonte:
http://www.genizahvirtual.com/2013/11/o-cristo-da-nossa-fantasia.html

Que o SENHOR tenha misericórdia de nós! AMÉM!

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Minha Maioridade e o Protestantismo!

Minha Maioridade e o Protestantismo

Catolicidade: a essência da reforma que renova

Por André Gomes Quirino

Quando criança, eu tentei criar "uma heresia só minha", para evocar as palavras do católico Chesterton. Não sei que idade eu tinha – talvez uns seis anos –, mas aquela invencionice por algum motivo me marcou. Pela mesma época em que procurava meios de dominar o clima (ordenar a chuva, o sol, o vento), eu houvera escutado que, sempre que chove, o céu está chorando pela morte de alguém. Acreditei. E as chuvas, para mim, passaram a ser mais melancólicas do que o normal. Numa bela manhã (porque aprecio mais as manhãs chuvosas do que as manhãs ensolaradas), num terreno abandonado que ficava em frente à minha casa, a chuva apagava uma fogueira que estivera acesa, fazendo-a evaporar. Incrementei a heresia: não só a chuva representava que alguém havia morrido, como a fumaça que subia para o céu representava a pessoa morta em caminho à eternidade. Por alguns minutos, levei aquilo muito a sério. Improvisei uma reza de oferecimento e, não contente com a função de mentor intelectual, quis ser o sacerdote daquele ritual: fui até a chuva participar de sua melancolia, fingir que as gotas que escorriam em minha face eram lágrimas. Depois, a fim de aprimorar o drama, peguei um pedaço de tijolo que estava no chão e, com ele, pus-me a escrever nomes aleatórios num muro ao meu lado, como desse baixa nas almas que se despediam da Terra. Lembro-me de ter escrito nomes que ouvira na igreja, como Abraão ou Moisés (é bem provável que não com a grafia correta). Alguém me chamou, repreendendo-me por estar na chuva. Resisti com um silêncio de mártir e encerrei a liturgia. Se não me falha a memória, foi assim que aconteceu.

O pecado original da minha seita foi a arbitrariedade. Não havia um paradigma para aquele ritual, nem um testemunho que me garantisse a validade da crença. Acreditei numa invenção despropositada. Como Eva acreditou no ludibrio da serpente e persuadiu Adão do mesmo, meu amigo que primeiramente ouvira sobre o suposto significado mórbido das chuvas foi ludibriado por ele e me persuadiu do erro. Eu quis ser um profeta, mas fui – e sou – só mais um Adão. Isto é pecado original. O pecado original da minha seita foi ignorá-lo. Deus estabelecera Adão como dominador sobre todo o resto da criação; deu-lhe até a função de inventar nomes para as outras criaturas. Adão quis conhecer os mistérios da criação, quis passar de inventor a criador. Ele poderia comer de todo fruto do jardim, inclusive do que dava – e dá – a vida eterna. Mas preferiu comer do fruto proibido. Assim como Lúcifer, Adão quis ser como Deus. Assim como Adão, eu desprezei a real beleza da chuva, do fogo, do sol e do vento – criações de Deus – e quis usá-los a meu bel-prazer. A árvore da vida está agora afastada de nós por espadas flamejantes e querubins. Fomos expulsos do Éden.

Mais tarde vim a entender que a semente de Eva finalmente feriu o calcanhar da semente da serpente quando Deus se fez homem, nascendo de uma virgem. O pecado original nos impossibilita de chegar até Deus, mas Ele veio até nós – e fundou uma Igreja.

Estamos a 31 de outubro de 2013. Hoje completam-se 496 anos desde o início da Reforma Protestante. Em quatro anos, o movimento protestante alcançará meio milênio de existência. Terá alcançado a maioridade? Acredito que sim. Os princípios de Sola Scriptura, Solus Christus, Sola Fide, Sola Gratia e Soli Deo Gloria reformaram minha vida e reformaram o mundo. Têm tudo para continuar a reformar. Mas o que merece maior atenção é que, se a Reforma Protestante aconteceu há quinhentos anos, a Igreja Protestante foi fundada há dois mil. Não fosse assim, eu e todos os outros Adões ainda seríamos escravos da arbitrariedade, tentando criar realidades a partir de palavras aleatórias, quando o Verbo divino que cria o que chama já descera à criação e já nos dera uma Palavra que testifica o Seu propósito. Para chegarmos aos quinhentos anos de Reforma como "maiores de idade", o que nos falta é, a meu ver, a consciência de que "somos católicos". Isso é o que enfatiza o artigo "Remember you are Catholic", de James K. A. Smith – que cita, também, a proposta de George Weigel, em "Letters to a Young Catholic", de que "o pensamento cristão adote um 'ecumenismo do tempo', empregando conhecimento e discernimento de qualquer época histórica". Não se trata de um projeto ingênuo e precipitado de união de correntes divergentes, sem maior reflexão. Trata-se de valorizar o que há em comum entre essas correntes e reconhecer o que elas têm a ensinar e aprender mutuamente.

O que nós, protestantes, por exemplo, temos a aprender com o catolicismo? Para responder a essa pergunta, contextualizo: todos concordamos, para citar o caso mais gritante, que neopentecostalismo e teologia da prosperidade são invencionices que nada têm de cristãs, protestantes (sobra algum dos solas nelas?) ou bíblicas – quase como a minha seita da infância –, ao mesmo tempo em que se proliferam assustadoramente nas igrejas evangélicas. Neste sentido, precisamos urgentemente de uma grande nova reforma. Isso invalida o movimento do século XVI? Com certeza, não. Naquela época já se dizia: "Ecclesia reformata et semper reformanda est" – o que implica numa postura, típica da Reforma, de constante autocrítica. Mas, além dessa implicação, há também a de uma incessante busca por unidade (a verdadeira, em que se une combatendo os erros; não a ingênua), por universalidade, por tradição. Enfim: o que é isso, senão catolicidade?

Não quero falar sobre o que está além da minha alçada. Mal acabo de chegar à maioridade. Repito o que escreveu Guilherme de Carvalho no último aniversário da Reforma: "Concordo que precisamos desesperadamente de ‘reforma’. Mas o que significaria reforma hoje, considerando a situação real da igreja evangélica? Creio que a única reforma possível para nós hoje é a redescoberta da catolicidade da Igreja. A igreja evangélica não sofre por falta de protestantismo, mas de catolicismo. É por isso que ela se fragmenta em um punhado de seitas pseudoevangélicas. E, antes que alguém se assuste, essa catolicidade não está no romanismo. Está no evangelho, sem dúvida. Mas, enquanto a igreja romana perde o evangelho por falta de reforma, a igreja evangélica perde o evangelho por falta de catolicidade e de seus veículos: credo, comunhão, tradição, unidade natureza-graça, história, heróis, e a visão de um Deus Trino que seja maior do que os nossos sentimentos e projetos religiosos".

Não usei uma experiência pessoal como ponto de partida deste texto por achar que o mundo deva se adequar ao meu umbigo (esse é precisamente o significado de "idiotia") – mas, pelo contrário, porque sou só mais um humano, que revive os dramas por que passaram bilhões de antepassados meus. Como é convencionado pela sociedade de que faço parte, a partir de hoje posso dizer que sou "maior de idade". Mas isso é uma mera formalidade, não garante maturidade, muito menos vida abundante. Fomos expulsos do Éden, vocês se lembram? E, para voltar a ter acesso à árvore da vida, é preciso ter fé na graça de Deus, revelada em Cristo e explanada nas Escrituras, que nos conclama a viver para Sua glória. O protestantismo não é "só meu", ao contrário da seita que criei na infância. Os mesmos cristãos que proclamam "Sola Scriptura! Solus Christus! Sola Fide! Sola Gratia! Soli Deo Gloria!" devem confessar: "cremos na Santa Igreja Universal". Assim vamos sendo reformados. Feliz 31 de outubro!

_________________

André Gomes Quirino, 18 anos, membro da Igreja Evangélica Assembleia de Deus- Ministério Ipiranga e é estudante.

Fonte:http://www.teologiapentecostal.com/2013/10/minha-maioridade-e-o-protestantismo.html

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